sexta-feira, setembro 22, 2006

Feche os olhos

Por Fabiana Lopes e Obede Jr.

Ela era loira, pele branca, bochechas e boca vermelha. Andava com os pés descalços no cafezal. Era no meio das árvores cheias de grãos que ela caminhava quando estava quente e quando precisava arejar os grãos de seus pensamentos. Se pudesse não faria mais nada além de ouvir histórias e cantar cantos entre a sombra das árvores. Suas canções preferidas eram as de amor, porque quando as cantava ficava imaginando histórias com cheiro de café e depois as escrevia em seu caderninho azul.
Ele, moreno queimado de sol, braços fortes da labuta, olhos cor de âmbar. Sorria e exalava saúde. Caminhava entre os pés de café como se fossem sua casa, e cada grão que colhia eram como se fossem seus filhos. Sonhava com sua fazenda cheia de cafezais e animais. Desejava um futuro bom, ao lado de um grande amor, como aqueles que acontecem nas histórias que lia. Adorava devanear enquanto sentia o café entre os dedos. A tardinha ia chegando com o sol já bem fraco e o trabalho já no fim.
Palpitava o coração. A palpitação não era ao acaso, a dois passos de seu destino o coração já antecipava a emoção que nem ele mesmo sabia que sentiria. Ele agachou para apanhar sua cesta e quando olhou pra frente, num raio de cinco metros entre as árvores ele viu um par de canelas brancas cercados por uma saia rodada estampada. A saia rodopiava enquanto ela cantava.
Ele podia ouvir a linda história da melodia e se os grãos de café tivessem ouvidos certamente não se deixariam colher enquanto não vivessem em seus pés o tempo suficiente para saborear aquele canção. A voz suave e doce da garota fez ele ficar agachado por muito tempo, paralisado, perplexo diante de tamanha beleza. Depois do encantamento, a curiosidade e a paixão lhe subiram a cabeça e ele queria descobrir quem era a dona das canelas e da voz mais bonita que ele já havia visto e ouvido. O som continuava a enfeitiçar seus ouvidos e sem ao menos perceber já estava de pé. Procurava a dona da voz e das canelas, mas procurava de um jeito incomum: De olhos fechados.
Os poucos grãos lhe escaparam entre os dedos. Agora caminhava, sem rumo, na escuridão de olhos cerrados, e sem ao menos perceber o que estava fazendo. O som só aumentava e a beleza da voz o envolvia cada vez mais. Sentia o coração como que se quisesse correr ao encontro de tudo. A escuridão dos olhos agora sumira, e via pés de café envoltos numa neblina refrescante, cabelos louros e um rosto perfeito. Estava tão perto. Queria tocá-la. Queria tomá-la nos braços. Já podia sentir o perfume de mulher misturados ao cheiro de café que ele tanto gostava. Estava agora ainda mais delicioso de se respirar.
Chegando bem perto percebeu algo incrível, estava de olhos fechados ainda. Pela primeira vez ele soube o que era ser guiado pelo coração. Quando ele abriu os olhos era como se ainda estivesse de olhos fechados pois enxergava exatamente o que seu coração sentia. Numa dança suave ela rodopiava e quando se virou de costa ele chegou bem perto de sua nuca e ela parou.
Sentiu o calor do corpo dele se aproximar e ouviu os passos que amassavam os grãos de café caídos no chão.
- Quem é você? Ele não conseguiu responder.
Num pensamento único, como se os dois tivessem a mesma idéia e o mesmo sentimento, os corpos se aproximaram, os olhos se fecharam e eles se descobriram ao deixarem seu lábios se tocarem.
E durante o beijo ele soube quem ela era e ela soube quem ele era como se já se conhecessem há tempos e como se a canela que ele vira fosse de alguém que caminhou ao lado dele a vida toda.
E quando então já haviam vivido todos os amores do momento, todos os sentidos e todos os desejos, ele olhou-a nos olhos e disse:
- Você é linda. Ela calou... caiu uma lágrima.
- Eu não o vejo, sussurou ela tateando o rosto dele.
Ele, por um instante, ficou surpreso e enxugando a lágrima disse sussurrando nos ouvidos de sua amada:
- Não tem problema, apenas feche seus olhos...
Ela sem entender: - Por quê?
- Apenas feche os olhos e me abrace, vai dar certo. Ela abriu um sorriso de certeza, fechou os olhos e ele a abraçou.
Nos braços dele, ela se sentiu livre de qualquer perigo, estava confortada com o calor do corpo dele, e como num instante mágico, aconteceu. Um clarão sobreveio e ela estremeceu o coração de felicidade. Abraçada a ele, via seus braços fortes protegendo-a, olhou para o grande pé de café atrás de ambos, envolto na neblina refrescante comum em sonhos. Ela então começou a chorar de felicidade, afrouxou o abraço e olhou bem para o rosto de seu amor.
- Você tem olhos lindos, ela disse.
Ele sorriu e beijou-a.
Ela continuou olhando para as feições de seu amor, e acreditava não poder encontrar homem mais bonito e valente.
Sorrindo para ela, ele apenas disse:
- Viu como funcionou? É fechando os olhos...
- ...que se enxerga com o coração! - ela completou como se soubesse desde sempre aquela frase.

4 comentários:

Silvia Regina Angerami Rodrigues disse...

ai, que delícia de conto, adorei reler!!!!!!

Anônimo disse...

Esse é um dos melhores contos que já fiz, lógico que devido a sua ajuda. É lindo não é mesmo??
E pensar que nossa idéia era totalmente diferente quando começamos a escrevê-lo..
Precisamos fazer mais.. muuito mais!

Beijos sista!
Te amo!

Pri Bella disse...

Vc e o Obede são fodas!
Mandam muito bem! Lind, lindo! To até emocionada!
Mudou layout do blog....hummmm!!!
Beijos!

Bruno Ferrari disse...

lindo... parabens para os dois!